Cartas de um diabo a seu aprendiz
Ao ler o título deste livro, o que lhe vem à mente?
Muitas pessoas se assustam quando faço esta indicação de leitura: “Mas que livro é este? Credo!”, dizem franzindo o cenho.
O autor é Clive Staples Lewis. Se você não reconheceu o nome, talvez C. S. Lewis soe mais familiar. Se reconheceu agora, sabe que os escritos de Lewis têm uma profunda espiritualidade cristã. Entre suas obras mais famosas estão as Crônicas de Nárnia, que ganharam adaptações para a tela do cinema.
Como o título sugere, Cartas de um diabo a seu aprendiz está em um contexto infernal. Assim como Deus designa um anjo da guarda para cada ser humano, Lúcifer designa um espírito diabólico para tentar cada pessoa. Neste livro, Maldanado, um diabo experiente, está ensinando seu sobrinho Vermelindo, um ‘estagiário’, como ser um tentador ‘de sucesso’. O objetivo é um só: roubar as almas para o inferno, eternamente. Maldanado fala das pessoas como pedaços de carne suculentos que se torna mais apetitoso quanto maior for o sofrimento, a angústia, a infelicidade e a solidão que somente o pecado podem proporcionar.
Para ser mais eficaz nas tentações, Vermelindo precisa, primeiro, conhecer o seu humano e é por aí que os conselhos do Tio Maldanado começam. Ele sabe que os homens são feitos à imagem e semelhança de Deus; sabe também das limitações e fraquezas humanas; sabe bem dos anseios dos corações e vai usar todo esse conhecimento para atacar; vai deturpar a interpretação de cada acontecimento da vida do homem e sussurrar em seu ouvido: “Deus não te ama e faz mal a sua história”.
Maldanado também conhece Deus, sabe que Ele usa todos os acontecimentos, as fraquezas, a personalidade e os anseios para salvar os homens e atraí-los, sussurrando em seu ouvido: “Eu te amo”. E, ao contrário dos homens que parecem não ter consciência da própria natureza e realidade, Maldanado tem pleno conhecimento de si mesmo, assume com tranquilidade que ele não pode vencer a Deus. Ele alerta ao seu sobrinho para ficar atento aos fatos e como Deus agirá em cada um, portanto, a missão de Vermelindo é distrair seu paciente com mesquinharias para que ele não perceba e não ouça a voz de Deus.
Neste livro, Lewis não fala dos grandes pecados, que são, de certa forma, fáceis de os homens perceberem e se arrependerem. Ele alerta para os “pecadinhos” mais banais, que parecem sem importância e acabam se tornando um vício. Uma vez viciados, os homens perdem a capacidade de reconhecer aquilo como pecado e, portanto, não podem - ou não querem - pedir a Graça necessária para combatê-los. Este é o maior perigo para nossa alma.
O primeiro passo do demônio para nos enganar, diz Lewis, é nos afastar da razão e nos manter no campo sensorial para que somente os sentidos nos façam entender o que é real ou não. Ainda sugere Maldanado para Vermelindo: “Acima de tudo, não tente usar a ciência (quero dizer, as ciências verdadeiras) como defesa contra o cristianismo. Elas vão positivamente encorajá-lo a pensar sobre as realidades que ele não pode tocar nem ver (...) Se ele insistir em meter-se com a ciência, mantenha-o no campo da economia e da sociologia; não o deixe se desviar da inestimável “vida real”. Mas o ideal mesmo seria não deixá-lo ler qualquer obra científica; antes procure dar-lhe uma sensação geral de que ele sabe tudo e que aquilo que consegue fisgar de conversas e leituras casuais é ‘resultado de pesquisas mais recentes’. Lembre-se de que você existe para confundi-lo. Da forma como vocês jovens demônios falam, qualquer um pode até achar que a nossa tarefa é ensinar!”
Cartas de um diabo a seu aprendiz vale cada minuto de leitura. Não uma leitura superficial, deitado na cama antes de dormir, mas uma leitura profunda. Sugiro uma carta por dia e, se você, assim como eu, não gosta de rabiscar o livro, pode, assim como eu, usar um bloquinho para anotar as frases que deseja destacar e, em seguida, escrever o que você entendeu ou a reflexão que ela te motivou, uma reflexão sobre você mesmo e sobre o mundo ao seu redor. É comum em alguns momentos do dia, diante de determinadas situações, eu me lembrar das falas de Maldanado e ver que eu estou caindo, justamente, nas armadilhas do meu “demoninho da guarda”.
Deborah Regina Figueiredo
Texto integral da minha coluna publicada na edição 569/out da revista O Verbo
Que saudades eu estava dessa escritora " tagarela exagerada e prolixa" exageradamente auto denominada hahahaha Amei! Li, mas percebi que li mal... preciso reler e anotar!!! é realmente um livro muito oportuno.
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